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Nobel
Autor
Jacques Fux
Editora
José Olympio
Tradução
Trajando calcinhas, o brasileiro, vencedor do Prêmio Nobel de Literatura, começa o seu discurso.
"... Usufruo da minha petulância, do meu falso poder e autoridade enquanto escritor para falar do que desconheço. Mas que me encanta. (E, se não quiserem ouvir minhas pobres explicações, azar dos senhores. Eu ganhei o Nobel, é meu direito falar a asneira que desejar.) No Japão, há várias categorias honrosas de seppuku: o conhecido suicídio ritual. Sensível às diversas manifestações de autoextermínio, a língua japonesa apresenta muitos termos para formas específicas de shi, ou morte. Shinjū é a palavra poética usada para o suicídio fruto de um pacto entre amantes. Roshi refere-se à morte por velhice, enquanto gokuraku-ojo é a morte de uma mulher causada pelo prazer de relações sexuais prolongadas. Senshi é a morte na guerra; junshi designa o suicídio de um guerreiro que segue e louva seu senhor até as profundezas da sepultura.
Senhores nipônicos, a morte ressoa um apogeu poético da vida.
Eu me fascino pela literatura e pela filmografia que corrompem o haraquiri impetrado pelos samurais adeptos da arte do Bushido. Também me emociona a morte-ritual realizada pelos kamikazes, que se mataram como armas e mísseis humanos ignorantes, em nome do imperador. Minha literatura é a cópia ipsis litteris do jisei — poema sobre a morte ou o “adeus à vida” deixado pelos apaixonados suicidas.
(Ainda me lembro com volúpia da visita ao Japão. Após uma série de palestras que realizei em algumas universidades, pedi para que me levassem ao submundo. Lá me deliciei com as desonrosas gueixas contemporâneas, com as bonecas sem vida e com as casas de carícias e massagens. Eu, que sempre fui avesso a jogos eletrônicos, gastei todo o meu cachê nas máquinas que vendiam roupas íntimas e usadas das ninfetas japonesas. Que delícia aquele odor de sashimi nas lingeries — essa é a minha verdadeira madeleine. Acreditem — e sintam a fragrância das raparigas e cerejeiras em flor —, senhores: estou trajando uma dessas calcinhas. Virou meu objeto de sorte. Do Japão, conservo o aroma e o sabor das mulheres que nunca vi.)"