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Quando sábado chegar
Autor
Afonso Machado
Editora
Citoliteratos/Amazon
Tradução
Todos temos o nosso dia de São Galo (Início do conto: Quando o pedal dá suas voltas)
“ ... Ler! O mais importante é ler... Livros, bulas de remédio, portas de banheiro público, WhatsApp, não importa. O importante é ler.
Quem já não ouviu um escritor numa entrevista ou nesses eventos literários; Flip, Flop, Off Flip, Flap, Flup, et cetera, dizer que a leitura é fundamental para a formação de um escritor? E não é? Quem dirá que não? Quem discordará?
Se me permitem, vou discordar.
Vivi uma experiência logo no início da carreira e que foi mais fundamental para minha formação de escritor do que ler. Tanto que ninguém, jamais, poderá imaginar como eu me sentia, o que passava pela minha cabeça, e quanto aprendi, anotei e amadureci profissionalmente, naqueles dias que pedalava a toda velocidade montado em minha bike, por mais de três mil quilômetros, de volta para casa. A esse acontecimento tão marcante em minha vida e que me transformou no escritor que sou hoje, recluso, avesso a entrevistas e aos meandros do mundo literário, dei o nome de Meu dia de São Galo.
O que fiz?
O que sempre faço quando batem em mim as indecisões: Agachei-me em frente a Platão, de um jeito que fico bem na linha de seus olhos e, olhos nos olhos, tentei captar a mensagem, o sinal. Busquei ler a resposta cifrada, como verdade absoluta.
Platão – do alto de sua sabedoria – devolvia-me apenas seu olhar canino, vazio de sentidos, de significados. Como se dissesse: lá vem você, outra vez, com suas literatices de merda!
Eu precisava decidir o caminho. Na verdade, confesso, já decidira (honestidade com os leitores! – ouvi, certa vez, de um escritor e não me lembro se numa feira ou bienal do livro). Mas o consentimento de Platão era para mim como se os deuses, sabe-se lá de que olimpo literário, abençoassem a escolha e prontamente se colocassem à disposição para a longa jornada que eu teria pela frente. Porque, com certeza, iria precisar de bênção e proteção. Para quem, como eu, que decidira se tornar escritor, contar, naquele início de carreira, com certos sinais; contar com o imponderável, o transcendente, aprender a considerar, por exemplo, o talvez de um editor como sendo uma resposta favorável para a publicação de um livro, era tudo.
Minha ideia, aliás como as boas ideias, era simples. Prova disso, é que podia ser resumida num parágrafo:
Ir do Paraná a Pernambuco, de bike. Exatamente de Curitiba a Porto de Galinhas, a tempo de participar em julho, daquele ano, da Fliporto – Festa Literária Internacional de Porto de Galinhas – cidade que dava o nome à festa.
Tive a ideia enquanto participava da Jornada Nacional de Literatura de Passo Fundo. Havia ido de ônibus. Mas se tivesse ido do Paraná ao Rio Grande do Sul, de bicicleta, talvez (e o talvez, para mim, era tudo) eu me fizesse notar. Para quem começava na profissão, eu acreditava, era um jeito de buscar um lugar ao sol. Se eu chegasse ao evento montado em minha bike, vindo de Curitiba, e conseguisse chamar a atenção para o fato, deixaria de ser mais um na multidão de escritores desconhecidos que disputavam assento no auditório, com originais debaixo do braço, para ouvir escritores conhecidos falar de obras desconhecidas. Enfim, era essa (confesso) a minha ideia: Aparecer!
Platão abanou o rabo e piscou para mim. Suas pupilas, lembro-me, ficaram dilatadas. Por um instante, do escuro de seus olhos, vi surgir a minha cor, igual à cor dos oceanos e tão cara para mim. Seria, nos seus olhos, o mesmo azul profundo a me confirmar algo? O mesmo azul que me ajudara, tempos atrás, a decidir o caminho da primeira longa viagem de bike que eu fizera, e que agora ao refletirem a cor aprovavam a minha escolha? ”
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Afonso Machado

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